Com o setor do turismo a registar os melhores números de sempre, em 2024, o número de novos hotéis no nosso país tem acompanhado essa evolução. Além de considerar Portugal “uma joia escondida no panorama turístico europeu”, Nicolas Cousin, Managing Director Espanha & Portugal da Christie & Co, salienta que, “apesar de ser um dos 10 principais mercados europeus, os custos operacionais e de construção são ainda mais baixos do que em países como Espanha, Itália ou Grécia”. E além do investimento, “os grupos internacionais estão a introduzir no mercado conceitos alternativos de alojamento”, diz o responsável da consultora.
O que explica o aumento da abertura de novos hotéis em Portugal?
Poderíamos dizer que Portugal sempre foi uma joia escondida no panorama turístico europeu, com a maioria dos ingredientes presentes em alguns dos principais destinos mundiais com grande património cultural, cidades e destinos de resort.
O recente crescimento de Portugal deve-se a vários fatores, tais como o ambiente macroeconómico positivo do país, o sólido desempenho turístico – isto depois de, em 2023, ter registado o maior número de dormidas de sempre, cerca de 77 milhões, e o RevPar atingiu um nível recorde de 65 euros – +32% em relação a 2019 -, os vários projetos de infraestruturas e um apetite crescente das principais cadeias hoteleiras para reforçar a sua presença num mercado que ainda é impulsionado por grupos hoteleiros locais.
Este crescimento é uma resposta à procura ou uma aposta no futuro?
Este crescimento é impulsionado por uma combinação saudável de aumento da procura e melhoria do desempenho comercial dos hotéis. As perspectivas positivas em termos de acessibilidade e de crescimento económico sugerem que existem muitas oportunidades para uma maior expansão.
Mas qual a razão para tantos grupos hoteleiros internacionais estarem a investir no mercado português?
A procura em Portugal está fortemente orientada para os visitantes internacionais, que representaram 70% do total de dormidas em 2023. Entretanto, 80% da oferta hoteleira é operada por operadores locais. Esta lacuna representa uma oportunidade de ouro para os grupos hoteleiros internacionais entrarem num mercado com menos concorrência de marcas e captarem uma parte significativa da procura.
Além disso, este movimento é apoiado por investidores internacionais que procuram adquirir ativos neste mercado para os reposicionar e remarcar.
Quais são os fatores únicos que tornam Portugal atrativo para estes investimentos?
Portugal destaca-se pela sua combinação única de atrações orientadas para o lazer e uma rede de negócios robusta. Apesar de ser um dos 10 principais mercados europeus, os custos operacionais e de construção são ainda mais baixos do que em países como Espanha, Itália ou Grécia, o que o torna uma opção ainda mais atrativa para os investidores internacionais.
Por último, Portugal surge também como um mercado natural (e mais acessível) para os operadores que investem em Espanha.
Nesse sentido, o que é que Portugal pode oferecer em termos de oportunidades de negócio para grupos hoteleiros internacionais?
Os grupos hoteleiros internacionais estão sempre à procura de se expandir em mercados atrativos e Portugal é definitivamente um deles. Além disso, e como já referi, é um mercado dominado por operadores locais, pelo que existem muitas oportunidades para estes grupos se desenvolverem, quer através de arrendamentos, Hospitality Management Associates (HMA) ou acordos de franchising, quer em cidades ou destinos orientados para resorts.
80% da oferta hoteleira é operada por operadores locais. Esta lacuna representa uma oportunidade de ouro para os grupos hoteleiros internacionais entrarem num mercado com menos concorrência de marcas e captarem uma parte significativa da procura
E o que é que estes grupos internacionais trazem de novo ou inovador para o setor hoteleiro português?
Para além da captação de novos mercados e segmentos fiéis às suas marcas, os grupos internacionais estão a introduzir no mercado conceitos alternativos de alojamento. As aberturas recentes e o pipeline ativo para os próximos anos incluem marcas como Six Senses, Viceroy, Andaz, Nobu e Anantara, que irão reforçar o segmento de luxo. A Limehome e a Staybridge estão a melhorar o segmento de estadias prolongadas, a Social Hub está a oferecer um conceito híbrido entre hotel, hostel e alojamento para estudantes e a Residence Inn está a trazer residências de marca. Além disso, estão a ser desenvolvidos segmentos de nicho como o conceito “hetero-friendly” da Axel Hotels.
Como é que os grupos internacionais podem transformar a experiência e a oferta hoteleira em Portugal?
A chegada destes operadores internacionais e as suas ofertas diversificadas irão alargar o leque de opções de alojamento disponíveis, respondendo a diferentes segmentos da procura. Isto tornará Portugal um destino ainda mais atrativo na Europa, com novas alternativas como as estadias prolongadas, as residências de marca e os conceitos híbridos. Para além disso, o aumento da concorrência e do nível de qualidade irá aumentar a qualidade geral da oferta no país.
Futuro Six Senses Lisbon, na Rua de São José | Créditos: DR
Em que regiões de Portugal estão os investidores a concentrar o seu interesse e porquê?
Destinos de excelência como Lisboa, Porto e o Algarve continuam a liderar o desenvolvimento hoteleiro em Portugal, representando 70% dos quartos planeados. Estas áreas beneficiam de um excelente desempenho hoteleiro e de um crescimento esperado da procura impulsionado por melhorias nas infraestruturas, mantendo-as na vanguarda do turismo europeu.
No entanto, estes mercados estão a atingir a maturidade e as oportunidades de desenvolvimento são cada vez mais escassas, gerando mais oportunidades de reposicionamento do que de desenvolvimento puro.
Existem regiões emergentes fora das zonas tradicionais como Lisboa, Porto ou Algarve?
Para além de Lisboa, Porto e Algarve, existe um interesse significativo nas regiões Norte (excluindo o Porto) e Centro, graças às suas boas ligações rodoviárias e ferroviárias às principais cidades. Cidades como Braga e Viana do Castelo, no Norte, e Coimbra e Fundoais, no Centro, são exemplos disso. Estas áreas também beneficiarão dos desenvolvimentos planeados para as infraestruturas, melhorando a sua conectividade com os principais centros e com Espanha.
As questões burocráticas, os preços dos imóveis ou falta de infraestruturas podem constituir os principais obstáculos que os grupos internacionais podem enfrentar quando investem em Portugal?
Apesar de existir uma moratória no licenciamento do alojamento local (hostels, Airbnb e guesthouses com menos de 10 quartos) até 2030, não vemos uma barreira comum que afete todo o mercado português.
No entanto, cada destino precisa de ser analisado individualmente. Por exemplo, o processo de licenciamento em Lisboa pode ser lento, e no Porto, o aumento esperado da oferta pode desafiar os níveis de ocupação a curto e médio prazo.
Futuro Axel Porto | Créditos: DR
Para que públicos-alvo ou segmentos de mercado estão a ser desenvolvidos estes novos hotéis?
Estão a ser desenvolvidos novos conceitos para dar resposta a uma grande variedade de procura, desde o segmento ultra-luxuoso, passando pelos viajantes de negócios que recorrem frequentemente a hotéis de estada prolongada, até aos grupos e nómadas digitais que podem preferir um serviço limitado ou conceitos híbridos.
Existe, então, um enfoque no turismo de luxo, nas viagens de negócios, no turismo sustentável ou noutros nichos?
Embora haja uma distribuição saudável entre os segmentos, espera-se que os segmentos de luxo e económico-médio registem o maior crescimento com um maior interesse por parte dos operadores (ou seja, Travelodge, B&B, para o segmento económico).
De que forma é que este investimento de grupos internacionais ajuda a reposicionar Portugal no mercado global da hotelaria?
A entrada de operadores internacionais tende a atrair viajantes com maior poder de compra, impulsionando o desempenho dos hotéis não só em localizações privilegiadas, mas também em mercados secundários. Isto ajuda a distribuir a procura por diferentes áreas, reduzindo o congestionamento turístico nas principais cidades e atenuando as pressões sazonais. Além disso, posiciona Portugal na vanguarda dos destinos turísticos.
Quais são as expectativas para o futuro em termos de competitividade com outros mercados europeus?
Portugal é um mercado em rápido crescimento, sendo o quarto país europeu com o maior aumento da oferta de quartos e o sétimo em termos de crescimento do RevPAR em 2023, em comparação com 2019. Isto indica que Portugal continuará a solidificar a sua posição como um destino de topo na Europa, apesar da sua menor dimensão em comparação com mercados maiores como Itália ou Espanha.
Como especialista, que conselhos daria aos grupos internacionais que estão a considerar investir em Portugal?
A chave é avaliar as necessidades do mercado e a proposta de valor que se pode oferecer enquanto grupo hoteleiro internacional. Para compreender bem a dinâmica do mercado, recomendamos vivamente que os operadores internacionais que ainda não estão presentes no mercado trabalhem em estreita colaboração com especialistas locais e internacionais.
Existem algumas tendências ou oportunidades no mercado português que ainda não foram exploradas?
Como já referi, os tipos alternativos de alojamento estão a entrar rapidamente no mercado. Para além das estadias prolongadas, dos conceitos híbridos e dos segmentos de nicho, há um interesse crescente pelos parques de campismo. Seguindo tendências semelhantes às de Espanha, os fundos institucionais estão a apostar no desenvolvimento de carteiras de parques de campismo com operadores especializados. Por exemplo, a marca WeCamp, pertencente ao fundo de investimento espanhol Meridia, tem já seis parques de campismo em funcionamento em Espanha, quatro em preparação e adquiriu recentemente um parque de campismo no Alentejo.