No coração do Porto, junto à Avenida da Boavista, o Palacete Severo surge como um pequeno oásis no centro da cidade. De portas abertas desde outubro de 2024, o edifício classificado como imóvel de interesse histórico, reconvertido num hotel de luxo com 20 quartos, pertenceu ao arquiteto Ricardo Severo, que em conjunto com outros colegas de profissão visionou “a casa portuguesa ideal”. O local, onde viveu juntamente com a sua mulher, Francisca Dumont, de origem brasileira, faz referência não só a elementos portugueses, como também à ligação ao Brasil, “quer no tipo de cerâmicas e madeiras utilizadas, como nos elementos escolhidos para os vitrais”.
A explicação é dada por Joana Almeida, que assumiu a direção-geral desta unidade hoteleira ainda antes de se encontrar em funcionamento, em maio de 2023. Enquanto percorremos os corredores e salas deste palacete, Joana Almeida conta que o projeto surgiu de um investimento de cerca de 4 milhões de euros por parte de um casal de investidores franceses da Constellation du Taureau. Apesar de nunca terem investido em hotelaria, o casal “apaixonou-se” pela casa e respetivo jardim, ambos classificados como imóvel de interesse histórico.
Detentores de uma galeria de arte em Paris no distrito de Saint-Germain-des-Prés, a Galerie Perspective, o casal decidiu estender este espaço dedicado à criação de arte contemporânea ao Palacete Severo, que funciona com uma programação autónoma, quer nos espaços comuns da unidade hoteleira, quer nos próprios quartos, com obras disponíveis para venda.

Créditos: Just Frame It
Desta forma, os 20 quartos do hotel – 11 inseridos no palacete e nove localizados numa ala de nova construção – contam com uma personalidade própria, pontuada pelas obras de arte que os adornam. No caso dos quartos do palacete, a própria arquitetura do edifício oferece vários pormenores curiosos: no antigo escritório do arquiteto, agora reconvertido em quarto, ainda é possível perceber o local onde se situava o cofre da casa, cuja dimensão permitiu instalar a casa de banho deste quarto. Com acesso direto ao jardim, o quarto dá a ideia de se dormir no próprio exterior, com todo o conforto de um cinco estrelas.
Se o spa se localiza na nova ala de quartos, sob a marca Olivier Claire, os dois restaurantes da unidade hoteleira, o Éon Restaurante e o Bistrô Severo, fazem uso das antigas salas e pátio do palacete para oferecer um ambiente acolhedor.
Sob a chefia de Tiago Bonito, o Éon Restaurante assume-se como um restaurante gastronómico com menus de degustação de dez e 14 momentos. Já o Restaurante Bistrô, de cozinha mediterrânica, assume um caráter “mais tranquilo”, de acordo com Joana Almeida, sendo o local onde se servem os pequenos-almoços e os menus executivos ao almoço.
Eventos personalizados
Com um percurso fortemente ligado à hospitalidade, particularmente na organização de eventos – chegou a assumir funções no Europarque – Joana Almeida transitou do Sheraton Porto Hotel & Spa para a direção deste boutique hotel.
O convite para fazer parte deste projeto surgiu numa altura em que a profissional pretendia “sair da zona de conforto”, após vários anos enquanto general manager de um hotel com 266 quartos. O conceito de arte inserido na hotelaria, a visão dos proprietários sobre o tipo de hospitalidade que pretendiam oferecer na unidade e o legado do projeto convenceram Joana Almeida a aceitar o cargo no Palacete Severo.
“Tinha saído do Sheraton Porto Hotel & Spa, onde estive muitos anos, e estava num processo de pensar o que é que queria fazer. Não queria fazer igual, queria sair um bocadinho da minha zona de conforto. Para mim, a hotelaria faz todo o sentido quando o serviço é o centro da sua atividade. E esta unidade, pelo seu conceito, por aquilo que fui falando com [os proprietários] e o alinhamento de pensamento sobre o que poderia ser o hotel, [convenceu-me a aceitar o cargo]”, explica Joana Almeida à Publituris Hotelaria.
O Palacete Severo conta apenas com uma sala de eventos, pelo que Joana Almeida aponta que o desafio agora passa por trabalhar na personalização. Se há aspetos que não são necessários como acontece num hotel de grande dimensão, como é o caso do kit de banquetes, passa a existir “um maior envolvimento naquilo que é a sua preparação, no conceito do que o cliente vai querer”. Como explica, “nós próprios também nos envolvemos de outra maneira, é tudo muito personalizado, muito tailor-made, e essa é que é a grande diferença de um hotel mais pequeno e com este conceito”.

Créditos: Just Frame It
Admitindo que a organização de eventos faz parte do seu ADN, Joana Almeida aponta que a escala e dimensão permitem fazer “coisas quase improváveis”: “Nem sempre os grandes eventos nos realizam mais do que um pequeno evento, porque há pequenos eventos onde nos envolvemos de uma forma [diferente]”, afirma.
Mercado australiano foi “uma surpresa”
Com o hotel a captar mercados como o norte-americano, brasileiro e europeu nestes primeiros meses de operação – particularmente os mercados britânico e alemão –, Joana Almeida refere que a chegada do mercado australiano ao hotel foi “uma surpresa”, por não terem reunido esforços comerciais nesse sentido. Também o mercado nacional procura o hotel, contudo, e neste momento, “mais na área de negócios do que de lazer”.
Quanto aos públicos-alvo do hotel, Joana Almeida refere que estes terão de ter “alguma literacia para usufruir em pleno daquilo que o espaço entrega, não só do ponto de vista da arquitetura, e recuperação, [mas também] da arte que está expressa na galeria”. O turismo de saúde é outra das motivações dos clientes que têm acorrido à unidade, “especialmente do mercado norte-americano”, dada a proximidade ao Hospital das Forças Armadas e ao Hospital Lusíadas.

Restaurante Severo | Créditos: Just Frame It
No acumulado até janeiro, Joana Almeida aponta que a taxa de ocupação se encontrava nos 63%, sendo que a expectativa passa por “chegar ao final do ano com 85 a 86% de ocupação”.
Já o posicionamento da unidade é “claro”. Com o intuito de se situar num patamar “elevado” a “muito elevado”, o hotel pretende, acima de tudo, celebrar a “unicidade” do edifício em que se insere, fugindo do ostensivo.
“O luxo é o tempo e a vivência de um espaço destes, poder estar aqui tranquilamente, quer a trabalhar, quer em lazer, e isso advém de um serviço irrepreensível. E é por aí que nós queremos posicionar a unidade”, termina Joana Almeida.
*Artigo publicado originalmente na edição 226 da revista Publituris Hotelaria