Esplanadas: Licenciamento zero, constrangimentos mil
A opinião de Ana Jacinto, secretária-geral da AHRESP – Associação da Restauração, Hotelaria e Similares de Portugal.
Publituris Hotelaria
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Com a chegada do tempo quente, é inevitável sentirmos aquele desejo de podermos ir a uma qualquer esplanada, seja junto à praia, nas cidades ou na mais pequena aldeia do nosso Interior.
Nas grandes metrópoles, cada vez mais surgem espaços inovadores no cimo dos prédios, com rooftops lindíssimos e com sunsets absolutamente arrebatadores.
E esta não se pode dizer que seja uma moda de agora. Já no final do século XIX, o Grande Hotel do Porto dispunha de um espaço desta natureza, embora apenas com mesas, cadeiras e pouco mais. Mais tarde, já no século XX, foram surgindo várias esplanadas ligadas a restaurantes e às então casas de pasto, com as icónicas cadeiras Gonçalo do mestre serralheiro Gonçalo Rodrigues dos Santos, que ainda hoje são uma referência. Nessa época, até o aeroporto de Lisboa tinha uma esplanada junto à pista, que hoje faria as delícias dos mais exigentes adeptos de plaine spotting.
As esplanadas foram e serão sempre muito apreciadas pelos nossos clientes (e quanto a isso não tenho a menor das dúvidas), mas o mesmo parece não se aplicar aos nossos poderes públicos, que dão a ideia de querer onerar em demasia quem tem a “ousadia” de querer ocupar um espaço que é público e que é de todos nós, esquecendo-se o que de bom as esplanadas trazem para as localidades, sejam elas quais forem.
Desde logo a natureza desta ocupação, que é precária, por natureza, normalmente por um ano, renovável (ou não). Com esta limitação, e sem garantias de continuidade por um tempo determinado e mais ou menos alargado, obviamente que é desincentivador de qualquer tipo de investimento mais robusto.
Mas ainda que assim não fosse, existem determinados entraves que desaconselham uma verdadeira aposta numa esplanada e que impedem que se criem as condições necessárias para que as esplanadas possam ser utilizadas 365 dias por ano.
Fico sempre muito surpreendida quando visito países em que apenas podem sonhar em ter as nossas condições naturais e climáticas e, ainda assim, conseguem ter esplanadas lindíssimas, apelativas, algumas “fora da caixa”, confortáveis e que funcionam em todo o seu esplendor, todo o ano.
Por cá, tal seria impossível. E porquê? Porque, ou a esplanada não pode ser fechada ou não pode ter estrado, ou porque não pode ser delimitada, ou porque não pode ter aquecedores, ou porque todo o mobiliário tem de ser removido depois do estabelecimento encerrar, ou porque é branca, ou porque é preta, enfim, muitas são as razões que levam a que ainda não tenhamos esplanadas com o conforto, a atratividade e a dignidade que deviam ter, salvo honrosas exceções, ou então quando as esplanadas se encontram em propriedade privada.
E depois as taxas e taxinhas, qual cereja no topo do bolo, e que são um custo que não é despiciendo, havendo autarquias com valores muitos díspares, sendo altíssimos em alguns casos.
Penso que ontem já era tarde para se começar a olhar para as esplanadas de outra forma, como um verdadeiro produto turístico, per si, que cria negócio (direta e indiretamente), cria postos de trabalho, favorece a sociabilidade e valoriza os territórios.
Seja para beber uma cerveja no verão ou um chocolate quente no inverno, gostava de não ter de voltar a ansiar pelo bom tempo para usufruir do prazer que é estar numa qualquer esplanada.
Ana Jacinto
Secretária-geral da AHRESP – Associação da Restauração, Hotelaria e Similares de Portugal
*Publicado no formato imprenso da edição 204 da Publituris Hotelaria (abril de 2023)