Opinião: “Taxa Municipal aos Excursionistas”
Leia aqui o artigo de opinião de Alexandre Marto Pereira, CEO da United Hotels of Portugal.
O Presidente da Câmara de Repolho do Sul entrou na sala. Presentes estavam o Vereador das Finanças e o Chefe de Gabinete. A reunião era secreta, e para obnubilarem as eventuais escutas, usavam sempre as iniciais das suas funções.
O PC deu a palavra ao CG. Este era um conselheiro valioso, que escutava o povo e os opinion makers locais – normalmente no Café Central, ponto de encontro da elite da vila.
“O tema, PC, é o excesso de turistas no nosso município, nomeadamente junto do fontanário barroco. Este fim de semana, uma camioneta vinda de Chaves bloqueou aquele lado do passeio, e o Doutor Martins, o reformado que tem casa ali, diz que já não consegue fazer a sesta. O momento é grave porque todos falam da confusão e temem pela insegurança que as multidões trazem. Há que fazer algo”.
O PC ficou chocado. Quando era presidente da junta homónima, tinha trabalhado afincadamente no Brasil para trazer turistas, riqueza e emprego, e agora os eleitores queixavam-se! Embora ainda não viessem brasileiros, estas excursões confirmavam o epíteto dado ao fontanário local: “A Fontana di Trevi de Repolho”. O Fonseca, do restaurante, faturava como nunca e tinha empregado mais dois jovens brasileiros, aliás os únicos jovens do pequeno burgo.
“O Fonseca é o único que lucra com isto, o resto do povo não gosta! Por isso tive a ideia de cobrarmos um valor por cada visitante ao fontanário. Pensei em cobrar aos que dormem, mas não temos hotéis no município…”, disse o VF.
“Só por inveja do Fonseca?”, espantou-se o PC.
“E pela confusão”, lembrou o CG, “o fontanário é nosso e eles invadem isto”.
“O fontanário é nosso?!”, exclamou o PC.
“Os nossos reclamam do preço da bica no Café Central, que aumentou! Mas os turistas pagam, alegres!”, disse o VF.
“Os turistas pagam…”, repetiu o PC.
“E seria uma fonte de receita! Os munícipes concordam com este novo imposto, desde que seja sobre não-munícipes”, retorquiu o VF, acalmando o PC. Mais receita é sempre bom, pensou. O festival do tremoço, em agosto, estava subfinanciado. Por outro lado, a ideia de lançar um imposto fazia-o sentir-se importante. Lançar impostos era um sinal de soberania, vedado aos maiores, os do governo de Lisboa. Quase se sentia primeiro-ministro ou ministro das Finanças. “Vamos avançar”, disse. “O imposto chamar-se-á Imposto Municipal sobre a Inveja, porque os visitantes têm inveja da nossa terra”.
“Mas PC, já existe um IMI! E dizem que não podemos lançar impostos, apenas taxas. Teremos de justificar com a existência de algo prestado aos excursionistas, porque turistas são os que dormem; e encontrar uma justificação económica”, disse o VF, que tinha tido uma formação sobre o assunto.
“Tens razão, trata disso, VF. E contrata o Dinis e o Guimarães para estarem no fontanário a contar os turistas. Há que lhes dar trabalho, fartaram-se de colar cartazes”.
“Pensei em cobrar apenas 1€ por visitante” disse o CG. Sem problema: poderiam duplicar a taxa a qualquer momento. E assim nasceu a primeira Taxa Municipal aos Excursionistas.
Alexandre Marto Pereira
CEO da United Hotels of Portugal
*Artigo de opinião publicado originalmente na edição 218 da Publituris Hotelaria