Financiamento Sustentável na Hotelaria: Realidade ou Ficção?
Leia aqui a opinião de Karina Simões, Head of Hotel Advisory na JLL Portugal.
Um dos elementos-chave para que a sustentabilidade se integre mais nas decisões de investimento hoteleiro são os mercados de dívida. À medida que as taxas de juro aumentam e o acesso à dívida se torna de maior importância, os investidores procuram cada vez mais desbloquear novas fontes de capital.
O financiamento sustentável, ou financiamento verde, como é mais comumente designado, materializou-se como uma opção possível, com os títulos verdes a tornarem-se mais predominantes. Na última década, foram emitidos 4,4 biliões de dólares em obrigações de impacto global, sendo que 66% foram emitidos nos últimos três anos. Estas obrigações, que seguem as orientações mundialmente reconhecidas pelos “Green Bond Principles”, oferecem normalmente aos mutuários um custo de capital mais baixo e condições mais favoráveis.
Embora a indústria hoteleira tenha inicialmente demorado a participar, com o BBVA e o Pestana Hotel Group da Europa a emitirem o primeiro título verde da indústria hoteleira em 2019, a adoção desta prática acelerou significativamente nos últimos anos. Mais recentemente, em Portugal, temos outro exemplo que é o da Catalyst Capital e o BPI, que contratualizaram um empréstimo verde para a aquisição e remodelação do Hotel Diplomático, em Lisboa, e que visa a adoção de soluções inovadoras e assentes em princípios de sustentabilidade.
Nos Estados Unidos da América (EUA), a Host Hotels & Resorts fez história no final de 2019 como o primeiro REIT hoteleiro a emitir um título verde. Desde então, seguiram-se múltiplas emissões de obrigações ligadas à sustentabilidade, totalizando quase três mil milhões de dólares. A Accor liderou o grupo na Europa, emitindo um título de sustentabilidade de 700 milhões de dólares em 2021. Também estão a ser feitos progressos na APAC, com o Park Hotel Group de Singapura a emitir 176 milhões de dólares em títulos verdes para refinanciar o hotel Grand Park City.
É expectável o reforço do crescimento neste segmento em 2024 e mais além, com a Europa provavelmente a liderar o caminho.
Existe, contudo, ainda um longo caminho a percorrer no sentido de estabelecer critérios/indicadores, afinar a ponderação/importância relativa dos mesmos, bem como tornar os processos mais eficientes e automatizados, de modo que as práticas sustentáveis possam fazer parte do ADN das unidades de alojamento turístico. A importância de tal facto vê-se reforçada não só num número crescente de empresas portuguesas a recorrer a estes mecanismos de financiamento, como também na perspetiva de que a emissão de dívida pública em Portugal acompanhe a tendência do setor privado. O passo seguinte, e que já se vislumbra para um futuro próximo, é que as obrigações verdes se venham a tornar o ativo de referência para o cálculo da taxa de juro sem risco.
*Artigo de opinião publicado originalmente na edição 220 da revista Publituris Hotelaria