Chef Rodrigo Madeira: “Gosto da cozinha com regras e métodos”
O chef Rodrigo Madeira assume a chefia do restaurante da Herdade da Malhadinha Nova desde 2019.

Carla Nunes
Escola de Hotelaria e Turismo de Setúbal leciona formação à medida para 14 projetos turísticos
AHRESP marca presença na Lisbon Food Affair com programa dedicado ao canal Horeca
Grande Real Santa Eulália aposta em vaga de remodelações
Carolina Afonso é a nova Chief Digital & Marketing Officer da Estoril 8023
Programa de Formação e Integração de Migrantes: 5 mil inscritos, mais de mil vagas abertas para 329 empresas
Eurostars Universal aposta em novo restaurante de fine dining
ERT do Alentejo e Ribatejo apresenta projeto de formação para o Litoral Alentejano
AHRESP inaugura oficialmente a sua delegação distrital em Braga
The Social Hub marca abertura de portas no Porto para 1 de março
Câmara de Setúbal aprova reconversão da 7.ª Bataria do Outão em empreendimento turístico
Foi na cozinha do restaurante Lobo Mau, em Lisboa, do chef Hugo Guerra, que a Publituris Hotelaria se sentou à mesa para falar com Rodrigo Madeira, chef-executivo na Herdade da Malhadinha Nova – Relais & Châteaux, em Albernoa, Beja. O chef visitou a capital a pretexto da iniciativa “O Lobo Convida”, onde após um jantar confecionado a quatro mãos falou sobre o conceito que trabalha nesta unidade hoteleira do Alentejo, a importância das regras na cozinha e a necessidade de assegurar bons salários e boas condições de vida aos cozinheiros para garantir bons profissionais.
Porque decidiu seguir cozinha?
Foi por acaso. Na altura estive à procura de vários cursos, se ia para desporto ou não ia, mas depois acabei por ingressar em cozinha. Quando fiz o meu primeiro estágio deu-me o clique e senti aquela adrenalina, aquela emoção, a vontade de querer mais e melhor, e a partir daí nunca mais parei.
Foi na Herdade da Malhadinha Nova que assumiu pela primeira vez o cargo de chef executivo, em 2019.
Como surgiu esta oportunidade e quais têm sido os principais desafios?
Trabalhei no Hemingway em Cascais, durante três anos, depois surgiu a oportunidade de ir para o Eleven, no qual estive dois anos com o chef Joachim Kroeper. Fui várias vezes à Malhadinha ajudar e fazer alguns serviços e depois houve o convite do Joachin e dos proprietários para assumir a chefia.
O principal desafio foi gerir a equipa sozinho pela primeira vez. No primeiro mês perdi a equipa toda, porque acho que implementei muitas regras que, para mim, são fundamentais na cozinha. Gosto da cozinha com regras e métodos. Todos podemos brincar, todos podemos rir, mas método e algumas regras são fundamentais para o funcionamento. Depois, contratei pessoas que conhecia, que confiava, e mantenho a mesma equipa há três anos consecutivos, o que acho que é fundamental. Grande parte do meu sucesso e do sucesso da Malhadinha devo-o à equipa. São pessoas em que eu confio cegamente, com quem já trabalho há muitos anos, como é o caso do meu sub-chef. Estudámos na mesma turma e estando eu a cozinhar ou ele é igual, não há diferença. É o António Simões, e acho que vai ser um dos grandes nomes da cozinha no futuro, em breve.
Como descreve a passagem para a Herdade?
Foi uma mudança gigante, a de deixar o centro de Lisboa por um sítio em que o mais próximo está a 20 quilómetros. Moro numa aldeia com 700 habitantes. Mas é muito bom, gosto muito da terra. É muito bom ter o contacto com a terra, ver como as coisas crescem, decidir o que pode ser plantado, utilizar o que a horta nos dá, ter os animais…. Fazer uma experiência tailor made para o cliente, que é o que fazemos. Desenvolvemos a experiência toda à volta do cliente e isso é muito satisfatório.
O conceito que trabalham na herdade da Malhadinha é “from farm to table”.
Exatamente. [Recorremos a] pequenos produtores, utilizamos só o que está na época ou coisas que produzimos. Por exemplo, às vezes tenho um prato que ainda tem ervilhas porque plantamos ervilhas no meio da vinha e das oliveiras, para dar força à terra e oxigenação, então, guardamos as ervilhas com métodos de preservação para podermos usar mais tempo. Enquanto temos o que é nosso, produzido em casa, vamos utilizar. Temos de ser sustentáveis, que usar tudo o que terra nos dá.
Dá mais trabalho operar neste tipo de conceito?
Dá. Temos de ser muito mais criativos, porque todos os ingredientes nos chegam em bruto. O nosso trabalho é transformá-los em obras de arte. Temos de valorizar o produto ao máximo, porque é excecional, possivelmente o melhor produto que já trabalhei alguma vez na vida. E depois, é não estragar. Temos muito pouco produto que não seja nacional. Entre legumes e frutas, enchidos, é tudo nacional.
Tendo em conta a “excelência do produto”, que importância assume o aproveitamento? Pergunto porque, atualmente, fala-se da questão da sustentabilidade como se fosse uma moda.
Acho que isso vem do que nós queremos enquanto cozinheiros. Para mim é fundamental utilizar todo o produto, desde uma casca até ao sumo. O nosso amuse bouche, por exemplo, muda todos os dias, e se não for para os clientes pode ir para o staff, tentamos utilizar tudo. Fazemos a comida do staff, são 120 pessoas todos os dias, o que é muito bom, podemos gastar os produtos – por exemplo, há aparas que já não conseguimos utilizar para o cliente, utilizamos para o staff, não há nada que vá fora, aproveitamos tudo.
As preferências dos clientes mudaram? Quais diria serem as tendências?
Acho que o cliente quer sempre ser surpreendido. Acho que neste segmento em que trabalhamos, o cliente não quer estar a escolher, quer ser surpreendido. [Ou seja, se eu disser] “Hoje tenho isto muito bom, é isto que quero oferecer”, ele diz “Muito bem, é isto que quero comer”. Também é uma relação construída ao longo dos anos. Os clientes são muito os mesmos.
Que ingrediente não pode faltar na sua cozinha?
Azeite, coentros, alho. O azeite da Malhadinha para mim é excecional, dos melhores azeites que alguma vez provei na minha vida.
Também têm sentido a falta de recursos humanos na cozinha?
Sente-se um bocadinho, mas não posso dizer que na Herdade da Malhadinha esteja muito mal, porque não estamos. Acho que hoje em dia, para assegurar bons profissionais, são precisos bons salários e boas condições de vida. Uma pessoa, além de ter um bom salário, tem de ter boas condições de vida. Se assim não for, ninguém vai trabalhar 20 a 30 horas seguidas sem folgas, sem nada. As pessoas querem saber com o que contam. Querem ter uma vida além do trabalho, porque só assim se cria uma vida familiar estável. A família é o suporte e é isso que é o mais importante. Claro que se sente muitas vezes dificuldade em encontrar as pessoas certas, mas quando encontramos é não deixar fugir, é não deixar que a pessoa pense que quer sair. É termos que os valorizar antes de eles quererem sair, e acho que isso é fundamental. Na Malhadinha tenho a sorte de isso poder acontecer.
Que conselhos deixa às gerações mais jovens que ambicionam chegar a chefs?
Trabalhem muito. Conheçam a cozinha portuguesa, o que é feito por nós, o que são os sabores tradicionais. Conheçam os pequenos produtores, do Zé Manel do talho ao senhor António que faz os enchidos. É muito importante este contacto com os produtores, acho que é fundamental. Além disso, é preservar o sabor, as nossas raízes. Com muito pouco, fazemos muito.
Quais os projetos para o futuro?
Continuar a minha linha de cozinha, trabalhando sempre com bons produtos e rodear-me sempre de uma equipa excecional. Agora, mudanças de ares, quem sabe o que o futuro nos reserva.