Alojamento Local: Polémica económica ou política?
A discussão em torno da actividade de Alojamento Local continua, mesmo após a aprovação das alterações à lei.
Patricia Afonso
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A polémica é grande e longa no tempo. O Alojamento Local está longe de ser consensual entre os ‘players’ do destino turístico português e parece que a paz não está para breve, embora o novo regime jurídico tenha sido aprovado no Parlamento e promolgado pelo Presidente da República. Enquanto entra e não entra em vigor, trocam-se estudos, estatísticas e opiniões a favor e contra o negócio nos moldes em que é e em que será feito.
Contactámos a pronunciar-se sobre o tema as associações mais pertinentes, mas apenas a AHRESP respondeu em tempo útil.
Afinal, o que muda?
Muita coisa e para todos os intervenientes no processo de um negócio de Alojamento Local, menos o turista.
As Câmara Municipais ganham poder com a nova legislação e passam a ter a possibilidade de criarem zonas de contenção, que deverão ser reavaliadas a cada dois anos, nomeadamente através de limite ao número de estabelecimentos; oporem-se ao registo; fechar espaços em funcionamento indevido. As autarquias, em conjunto com a ASAE, terão, ainda, de fiscalizar o cumprimento da legislação.
Passemos aos proprietários dos alojamentos: quer seja a título individual, quer seja colectivo, a lei define como limite máximo a propriedade de sete unidades; passa a ser obrigatório um seguro multirriscos, que cubra as partes comuns do edifício; os estragos efectuados pelos hóspedes passam a ser imputados, na sua totalidade, ao proprietário; é obrigatória a disponibilização de um livro com as regras de funcionamento e este tem que estar disponível, no mínimo, em quatro línguas (português, inglês e mais dois idiomas estrangeiros). Os empresários ficam, ainda, obrigados a afixar uma placa identificativa do alojamento, independentemente da tipologia do mesmo; passam a ter dez dias para comunicar o final da actividade através do Balcão Único Electrónico, assim como ao Booking.com e ao Airbnb; e as coimas aplicáveis vão ter o seu valor aumentado. Por outro lado, passa a ser reconhecida oficialmente a tipologia de ‘quarto’, embora num limite máximo de três unidades.
No que respeita aos condomínios, também esses têm uma palavra extra a dizer. Com a nova lei, esta ‘entidade’ passa a poder proibir a instalação de “hostels em propriedade horizontal nos prédios em que coexista habitação sem autorização prévia”, assim como recusar que a mesma aconteça de todo por “decisão de mais de metade da permilagem do edifício” e numa decisão fundamentada e comprovada da perturbação da “normal utilização” do prédio e/ou que “causem incómodo e afectem o descanso dos condóminos”. O condomínio poderá, ainda, aprovar um pagamento adicional, sendo que este agravamento pode atingir os 30%.
AHRESP alerta para “instabilidade” e “incerteza”
“As questões mais problemáticas têm a ver com disposições que, de uma forma ou de outra, têm como intenção limitar/condicionar o exercício da própria actividade, como é o caso do condomínio poder opôr-se ao exercício do Alojamento Local, pedindo à autarquia que cancele a actividade”, afirma Ana Jacinto, secretária-geral da AHRESP, em declarações à Publituris Hotelaria, acrescentando: “Esta prerrogativa, de poderem particulares solicitar que determinada actividade seja cancelada, não tem, desta forma, paralelo noutras actividades. Não temos qualquer dúvida que este regime irá fazer disparar a conflitualidade e a litigiosidade entre o condomínio e os agentes económicos.”
Por outro lado, diz a responsável, “podem agora as autarquias elaborar os seus regulamentos nesta matéria, prevendo um número limite de Alojamento Local em determinadas áreas, sem que se conheçam, ainda, os critérios para tal”. A associação, refere Ana Jacinto, “tem vasto trabalho feito com as autarquias, com a implementação do nosso Programa QUALITY, precisamente de valorização do Alojamento Local. Este é um caminho que pretendemos seguir. A AHRESP sempre trabalhou com as autarquias e continuará a fazê-lo na busca das melhores soluções, porém não podemos deixar de manifestar alguma preocupação sobre a forma como estas prevêem regular o Alojamento Local nos seus territórios”. A AHRESP apela, assim, neste momento, “ao bom senso, para que não se prejudique injustificadamente uma actividade que tanto tem contribuído para a nossa economia e para o nosso Turismo”.
“Obviamente que estas alterações, juntamente com outras que vêm impor mais obrigações, logo mais custos, vêm criar instabilidade e incerteza no negócio, uma vez que estão a ser profundamente alterados os pressupostos que existiam aquando da tomada de decisão e realização do investimento por parte dos empresários”, salienta Ana Jacinto, para quem “estas alterações aos diversos regimes que nos regem tem sido uma constante e parece estar enraizada no nosso legislador a ideia de que deve alterar a lei para responder às situações que vão surgindo a cada momento, sem dar o devido tempo para que aquela se consolide devidamente, pois só a partir daí poderemos avaliar e tirar as devidas conclusões”. “Não esqueçamos que estes booms a que temos assistido – e que não deixam de ser um “problema bom” que muitos territórios gostariam de ter – são cíclicos e já há sinais de que estão a abrandar. Todas estas variáveis devem ser devidamente analisadas e ponderadas antes de se tomar determinado tipo de decisões no sentido de se alterar a lei”, refere.
A AHRESP alerta, ainda, para o risco de “que se possa voltar à anterior situação de informalidade destes negócios, prejudicando toda uma actividade económica e o impacto indirecto positivo que gera”, além “de prejudicar as empresas, os postos de trabalho que asseguram e a própria oferta turística”.
Actividade “complexa” e “estrutura frágil”
Pela ALEP – Associação do Alojamento Local em Portugal, é já conhecida a posição conjunta com a AHRESP, tornada pública pela ocasião da votação no Parlamento. Em comunicado enviado a 11 de Julho, as associações alertavam que “todos queremos que este processo seja finalizado, o sector não pode continuar com esta instabilidade, mas seria um enorme fracasso se, depois de todo este processo e por precipitação, a legislação não fosse equilibrada e voltasse a colocar em risco milhares de famílias e micro-empresas ou, ainda, que não trouxesse a tão desejada estabilidade.”
“Os operadores deste sector têm uma estrutura frágil, são essencialmente particulares ou micro-empresas de cunho familiar que, na maioria, dependem hoje do Alojamento Local como único meio de subsistência. Ao todo, são 33 mil famílias e milhares de micro-empresas. Qualquer medida que não tenha o seu impacto devidamente avaliado coloca em causa o sustento de uma parte importante desta realidade”, referia a nota conjunta, ressalvando que a actividade de Alojamento Local “é extremamente complexa e exige um conhecimento técnico aprofundado, pelo que é preciso conhecer o sector para ter perfeita consciência dos efeitos das medidas tomadas”.
“Assim sendo, caso venham a ser implementadas políticas que não tenham essa realidade presente e que se mostrem desadequadas face à realidade do sector, podem ter um forte impacto negativo”, finalizavam a ALEP e a AHRESP na nota enviada às redacções.