A Memmo vai crescer
O Memmo Príncipe Real foi distinguido pela conceituada revista Monocle como o melhor ‘Smartest New Urban Hotel’. O ano que está a terminar fecha, também, a primeira década de vida do grupo Memmo. Estas foram as premissas que guiaram a conversa com Rodrigo Machaz e Paulo Duarte, director-geral e director de operações.
Patricia Afonso
“O cliente português é mais exigente que o espanhol”, admite José Luis Lucas (Hyatt Inclusive Collection)
EPHTL junta alunos e profissionais para debater perspectivas no setor
Cinco hotéis da AP Hotels & Resorts distinguidos com o selo Save Water
Vila Galé cria parceria com a VilacomVida para promover inclusão e diversidade laboral
Alunos das Escolas do Turismo de Portugal ganham medalhas internacionais
Minor Hotels abre oficialmente as portas do NH Collection Gent
Porto Business School e NOVA IMS lançam novo programa executivo “Business Analytics in Tourism”
ESHTE regista aumento de 25% em estágios internacionais
Eurostars Hotel Company chega ao País Basco com dois hotéis
Ariana Rodrigues debate desafios da liderança no “Be Our Guest” da ADHP
Que balanço fazem destes dez anos?
Rodrigo Machaz (RM): O projecto Memmo começou comigo, o Paulo Duarte e, na altura, o João Corrêa Nunes, também como sócio-fundador. E começámos de uma forma pouco convencional na hotelaria. Tínhamos um projecto que queríamos requalificar em Sagres, mas o primeiro investimento foi na marca. Fomos a uma empresa especializada, a Brandia, e foi aí que decidimos construir a marca, que é um pouco os nossos alicerces. Quando dizemos que investimos na construção de uma marca, não foi o nosso nome ou logo. Como se costuma dizer, um logo sem um propósito, é só um desenho. Aliás, temos um brand book onde estão perfeitamente claros e definidos os nossos valores, sejam os posicionais, relacionais ou os profundos da marca, uns comunicamos, outros não.
Quisemos definir desde o primeiro dia a nossa marca e os valores a comunicar. E são eles, em primeiro lugar, a hospitalidade. Sentimos que a nossa marca, por mais voltas que desse, não poderia nunca deixar de ser aquilo que é a sua génese, que é a hospitalidade. E isto é muitas vezes confundido com serviço. Hospitalidade é receber bem os clientes e queremos que toda as pessoas que entrem num Memmo se sintam bem-recebidos. É uma emoção, há uma empatia que se cria.
A contemporaneidade vem a seguir. Sempre quisemos fazer hotéis contemporâneos e, aqui, entenda-se hotéis do presente, não são do futuro, nem do passado. Perguntam-nos sempre se somos um design hotel… o ser design hotel tem apenas a ver com uma coisa: estarmos atentos às tendências. Não somos obcecados pelo design, mas somos muito atentos às tendências, quais são as tendências do mercado e o que o nosso cliente – metam-lhe o rótulo que quiserem, millennial ou o que entenderem – verdadeiramente procura num hotel para não estarmos na indústria do sono, mas na dos sonhos.
É uma missão cada vez mais complicada…
RM: É cada vez mais complicada, mas, também, mais fácil de fazer, porque é realmente o que as pessoas procuram. Memmo vem de memórias e as pessoas procuram cada vez mais hotéis que lhes fiquem na memória, valorizam cada vez mais a experiência. E é nessa linha que procuramos actuar. A nossa contemporaneidade tem a ver com isso, em criarmos hotéis em que as pessoas se sintam bem, sintam que é contemporâneo, actual, que há um sentido de estética apurado, não só na parte estética, mas, também, na abordagem.
Por exemplo, a Monocle considerou o Memmo Príncipe Real o ‘Smartest Urban Hotel’ e andámos aqui muito à volta do que é ser smart. Para mim, a tradução é que é na dose certa, que há um equilíbrio. Quando falamos de um dress code ‘smart casual’, é irmos à vontade, mas não é à ‘vontadinha’! E esse conceito é muito interessante: as smart cities, o que é o Turismo smart? Trabalhamos todos no Turismo e preocupamo-nos com o Turismo. Também temos todos a consciência que não é muito smart meter uma camioneta de 78 lugares em Alfama ou tuktuks a entrar pelas ruas, onde as pessoas que lá vivem nem saem.
São estas coisas que nos fazem sentir um pouco a contemporaneidade, no sentido de estramos atentos às sensibilidades dos clientes.
O terceiro valor é a originalidade, que, no nosso caso, tem a ver com a criatividade na Memmo. E não é inventarmos a roda, é fazermos o mesmo de forma diferente. Não vamos deixar de fazer o que sempre se fez, que é a boa cama e boa mesa, mas queremos surpreender os nossos clientes e contar histórias. Não há um passo que dê aqui [Memmo Príncipe Real] que não conte uma história, foi tudo feito com um objectivo, que é quem nos visita levar histórias para contar e criar memórias. Esta é a base do projecto Memmo: termos os valores bem definidos; esta vontade de sermos autênticos; e uma coisa muito importante, que acabou por se reconhecida pela Monocle, a nossa integração nos locais onde estamos.
A autenticidade que clamam é posta em causa pelo crescimento não regulado de outros tipos de alojamento?
RM: Sou ‘zero’ contra o Alojamento Local, pelo contrário, foi fundamental para a revitalização da cidade. Como sou ‘zero’ contra os hostels e os hotéis. Agora, a partir do momento que Alfama deixou de ter residentes porque foi tudo transformado em hostels, é um problema.
Não é com o AL, é com o convívio. É como em tudo. A última coisa que quero é destruir o que temos no Turismo. Penso que o tema do dia é ter a noção da capacidade de carga de um destino. Na Memmo preocupamo-nos muito com isso. Uma das coisas boas de Lisboa é a escala humana da cidade, irmos aos sítios. Se vamos a qualquer sítio e não podemos circular, é legítimo compararmos com Veneza ou Barcelona.
Do vosso ponto de vista, está em causa a identidade dos locais?
RM: Não está em causa a identidade de Lisboa, mas começam a haver sítios específicos na cidade em que isso está em causa. E Alfama é um deles. No plano de Marketing da Memmo, identificámos como ameaças a descaracterização e massificação do bairro de Alfama, porque sabemos que vai totalmente contra aquilo que os nossos clientes procuram. E, lá está, temos que fazer de Alfama um bairro smart e de Lisboa uma cidade smart. Não podemos querer todos, tudo, ao mesmo tempo e só há uma maneira: criar regras de entrada e convivência.
Mas as entidades estão a trabalhar nesse sentido ou ainda estamos todos a tentar perceber o que se passa?
RM: Acho que o tema da nossa geração é a sustentabilidade. De tudo. Já percebemos que há uma tendência de exagerarmos, mas, felizmente, já começámos a perceber isso. Grave é quando nem sequer se percebe.
Memmo Baleeira
O grupo nasceu na pré-crise e parte do negócio consolidou-se durante a crise. Como é que isso aconteceu?
RM: Foi a melhor coisa que nos aconteceu, porque os momentos de crise são os que nos fazem magros, rijos e fortes. E aprendemos com isso. E tivemos medo, como é óbvio. Em 2010 não era confortável olharmos para números como os que tínhamos em Sagres. Fizemos isto, acima de tudo, com uma enorme paixão, mas, também profissionalismo, demos o máximo para que corresse bem e acho que fizemos bem as coisas.
E o hotel está onde queriam quando o delinearam?
RM: Hoje, está, mas pode ir ainda mais longe. O caminho faz-se e, depois, criam-se outras outras metas. Pessoalmente, acho que atingimos tudo a que nos propusemos, talvez o mais difícil seja o mercado de reuniões. Acreditava que íamos ser mais fortes. E as pessoas já começam a querer coisas diferentes, mas, se calhar, quisemos ter razão cedo demais. Se calhar, as pessoas que entram agora no mercado de trabalho é que já não querem o tradicional. O chamado meeting package é completamente obsoleto, as pessoas querem almoçar de pé, comida saudável, estarem juntos.
Há um grande caminho para inovar na oferta dos hotéis para reuniões.
Mas continuam com essa aposta?
RM: Vai lá chegar! Só tivemos razão cedo demais. Temos o sítio mais espectacular para reuniões!
Quais são os números do Memmo Baleeira?
Paulo Duarte (PD): Há um momento claro em relação ao arrojo do investimento há dez anos, de fazermos um hotel de 150 quartos em Sagres. Há claramente uma época pré-Memmo em Sagres, em que o turismo era praticamente inexistente e isso foi um desafio. O nosso desafio antes de vender a Memmo, foi vender o destino Sagres.
Abrimos em 2007 e estivemos sempre dentro do business plan, com uma grande aposta no mercado nacional. Mas passados dois anos aparece a crise, que nos obrigou a emagrecer, controlar a estrutura e custos, mas, sobretudo, fez-nos pensar em começar a diversificar mercados. E foi o que fizemos desde 2009 e, depois destes oito anos, temos o nosso negócio perfeitamente diversificado entre seis ou sete mercados quase equivalentes ao português, o que nos permite estar muito mais bem preparados para qualquer contingência.
E quais são esses mercados?
PD: O alemão, inglês, belga, suíço, português e o espanhol. O francês e o americano começam a crescer. Os primeiros três e Espanha são os mais importantes. Esta diversificação permitiu-nos desde o final da crise crescer constantemente as receitas em dois dígitos. Este ano, vamos facturar aproximadamente 4.6 milhões de euros em Sagres. É um recorde de vendas, com uma nota importante: conseguimos alargar o Verão de um para quatro meses, e falo em taxas de ocupação acima de 90%; e conseguimos, entre Outubro e Abril, inclusive, ter taxas de ocupação muito interessantes, embora com preços diferentes. O nosso preço médio líquido é de 114 euros.
Agora, o negócio e o Algarve continuam a ser sazonal. Por estratégia não fechamos, excepto quando precisamos de fazer obras. Neste momento, estamos a 2/3 do investimento de três milhões de euros [dentro do Quadro Comunitário 2020] em remodelações e melhoramento do Memmo Baleeira, porque continuamos a acreditar no destino.
O Brexit é uma preocupação nesta unidade?
PD: Não sentimos uma quebra, mas, se calhar, não trabalhamos o mercado de forma tão activa como a maior parte dos hotéis. Agora, o risco para o destino existe, tanto que o mercado baixou na região.
Memmo Alfama
Dando o salto para Lisboa. Abriram o Memmo Alfama em 2013, logo no pós-crise, o investimento foi feito em plena crise. Como é que se reestruturaram para isto e que balanço fazem?
RM: É preciso ter consciência que quando decidimos vir para Alfama, estávamos em plena crise, os investimentos hoteleiros tomam-se três ou quatro anos antes. Acho que o empreendedorismo é sempre um acto de fé, uma pessoa acreditar, e não fazemos esses actos na loucura. O que nos apaixonou em Sagres foi a autenticidade da região e queríamos vir para Lisboa porque achávamos que a cidade tinha essa autenticidade, mas diferente, assente em duas coisas: nos bairros e no rio. E apaixonámo-nos desde o primeiro dia pelos bairros, que achamos que são as novas cidades. E as cidades são os novos países. Acreditámos muito nisso, o que foi bom, porque depois houve todo este movimento a que se assiste à volta dos bairros.
A Memmo está na vanguarda da hotelaria?
RM: Tenho uma certa dificuldade em definir o que é a vanguarda. Se procuramos ser vanguardistas? Procuramos no sentido de ver antes. Mas não pioneiros. Se estamos ou não na vanguarda, os nossos clientes é que têm que o dizer.
Na altura em que viemos para Lisboa, também acreditámos que ser pequenos não era uma desvantagem, mas uma vantagem para ser diferente; e não era obrigatoriamente pior; dava-nos alguma agilidade. Portanto, fomos com 41 quartos para Alfama, com um projecto vanguardista no sentido em que quisemos fazer um hotel em que as pessoas se sentissem em casa, o que não era de todo a lógica dos hotéis na altura, era a dos hostels, que, aliás, estudámos muito. Foi quando começámos a ver que os hostels trabalhavam o lado social e era aí que ganhavam terreno, mas perdiam nos quartos. Hoje já se vêem muitos hostels a profissionalizarem-se, é legítimo, são as dinâmicas do mercado.
O Memmo Alfama teve uma adaptação muito forte logo de início. Também coincidiu com o mercado de Lisboa começar a crescer, foi um conjunto de factores.
E no que respeita aos números de Alfama?
PD: O sucesso do Memmo Alfama resultou de uma conjugação de três factores. Para começar, foi o primeiro hotel do bairro, e Alfama não era o que é hoje, e as zonas históricas e antigas vendem. Em segundo, foi um conceito inspirado q.b. nos hostels. Os hotéis sempre disseram que queriam que os hóspedes se sentissem em casa, mas fomos mais longe e quisemos que se sentissem numa casa fisicamente, e isso está nos detalhes: o tipo de material usado, o ambiente, a mobília, no serviço, na proximidade muito grande. E o terceiro ‘click’ é precisamente esse informalismo, através do qual conseguimos influenciar a experiência do cliente. Este tipo de atendimento permite ter um conjunto de ‘reviews’ muito positivos e que aconteça o ‘passa-palavra’. Hoje em dia, temos clientes que não conseguem reservar quarto, mas vão ao hotel para conhecer, porque alguém os aconselhou, leram em algum sítio.
RM: E há uma coisa importante nos três hotéis, de uma forma mais intimista no Alfama e no Baleeira, que é a vista. Tivemos um enorme cuidado em escolher localizações verdadeiramente ‘unforguettable’ [inesquecíveis], que é o nosso ‘clame’: Memmo, Unforguettable Hotels.
E quais são os indicadores de Alfama?
PD: A facturação vai ser de 3.2 milhões de euros este ano, 183€ de preço médio líquido e 93% de taxa de ocupação. A nossa estratégia em todos os hotéis é o preço, mais do que ocupação.
E os mercados?
PD: Curiosamente, tirando o espanhol, são os mesmos. O português, como é evidente, tem menos significado. Não trabalhamos muito mercados orientais, mas um mercado que temos muito interessante, e diria pouco vulgar, é o australiano.
Memmo Príncipe Real
Como é que chegamos ao Príncipe Real?
RM: Foi, mais uma vez, uma feliz coincidência. Queríamos continuar em bairros autênticos, mas procurávamos uma oferta mais de charme, sem ser romântico, mas contemporâneo. E o que gostámos no Príncipe Real desde logo, foi, em primeiro, a localização, apaixonámo-nos pela vista, mas, acima de tudo, por esta dicotomia de tranquilidade e vibração. É um bairro com uma ‘movida’ muito interessante. O maior desafio foi o posicionamento do hotel. Estamos sempre a dizer que ‘não queremos fazer mais do Memmo’, não somos uma cadeia, somos uma colecção de hotéis, que se querem autênticos, únicos, diferentes, mas preservando os valores da marca. Então, a decisão foi fazer um boutique hotel, a oferta premium da Memmo, que apostasse num preço mais alto e procurasse um cliente disposto a pagar mais por uma coisa diferente. E, acima de tudo, quisemos redefinir um pouco o que é o luxo, e trabalhámos nisso. E é o que a Monocle reconhece.
O que significa este reconhecimento?
RM: Quisemos este posicionamento porque é o que tem a ver com o bairro, acrescenta alguma coisa à Memmo e porque era um mercado com menos oferta. E os nossos resultados deixam-nos muito satisfeitos.
Outra decisão que tivemos que tomar foi se íamos fazer um restaurante, de que escala e para quem. Aqui a estratégia foi diferente, quisemos que a comunidade entrasse e interagisse, e, então, pensámos num restaurante totalmente independente do hotel, promovemos o nosso cocktail bar, o terraço, animámos o espaço. E conseguimos que um restaurante que serve hoje, em média, 60 refeições por dia, tivesse 90% clientes de Lisboa. As pessoas são convidadas a vir cá. E acho que foi isso que a Monocle valorizou.
O que é que significa? Para a Memmo, muito. Para mim, tudo. É ser reconhecido pelas pessoas que sei que valorizam e identificam as tendências actuais. É a revista que fala com o nosso cliente target. Não estávamos à espera, não sabíamos minimamente, e ao fim de um ano, receber isto significa que pensámos e executámos bem as coisas. E é bom para a Memmo, para a cidade, para tudo. Agora, queremos capitalizar isso para o bairro e para o hotel. O maior desafio é continuar a cumprir com as expectativas de quem vem cá.
E quais são os resultados do Memmo Príncipe Real?
PD: Vamos fechar o ano com 85% de ocupação, o que é muito bom, ainda por cima porque o primeiro trimestre foi em soft opening. Vamos ter um preço médio de 227/228 euros net e a facturação vai ser de 4.1/4.2 milhões de euros. O nosso restaurante tem um peso de um milhão de euros.
Em termos de grupo, este ano falamos de uma facturação de aproximadamente 12 milhões de euros e, para 2018, temos o objectivo de mais um milhão de euros.
Novos projectos
Têm novos projectos?
PD: Existem dois novos projetos previstos para Lisboa: um com uma escala inferior à actual oferta do grupo, sendo que o nosso hotel mais pequeno tem 40 quartos; e um segundo será o maior projeto da Memmo na cidade. Ainda não podemos divulgar as localizações, mas, à semelhança dos anteriores, serão em zonas históricas.
Qual é o investimento previsto?
PD: Ronda os 30 milhões de euros.
Estão a analisar alguma coisa fora de Lisboa?
PD: Estamos atentos a outras zonas do País, como Porto, Algarve ou Açores, estando neste momento em fase de estudo de um novo projeto no Algarve.